Aos 15 anos, tive minha primeira crise de enxaqueca. Eu estava na escola. Vi uma série de pontinhos de luz – que depois descobri ser a famosa aura – e, em menos de cinco minutos, a dor lancinante estava instalada. Em uma hora, eu estava vomitando.
A primeira suspeita de colegas e professores foi a mais óbvia: será que ela está grávida? Não estava. E não estive nos 15 anos seguintes. Mas convivi com crises horrorosas de enxaqueca que me levaram diversas vezes para o hospital.
Entre um médico e outro, ouvi mil explicações que nunca fizeram sentido:
– Criança não tem dor de cabeça
– Menstruação causa enxaqueca mesmo
– Quando engravidar, passa
– Precisa dormir mais
– Não pode tomar café ou comer chocolate.
Já adulta, as crises continuaram cada vez mais frequentes. Ainda assim, tomei pílula anticoncepcional com estrogênio e progesterona por anos. Nunca, nenhum ginecologista com quem me consultei e que me receitou pílula considerou meu histórico enxaquecoso. Hoje, já se sabe que as pílulas orais agravam muito as crises de enxaqueca e, em pacientes com aura, aumentam o risco de se ter um acidente vascular cerebral.
Dois anos atrás, minha filha Estela, então com 11 anos, passou meses com dor de cabeça. Entrei em pânico com a possibilidade de ela ter herdado este drama de mim. Depois de leva-la a vários médicos – pediatra, endocrinologista e neurologista – e ela superar um período longo de estresse, descobrimos que as dores tinham fundo emocional.
Estou contado isso porquê? Porque diagnosticar enxaqueca não é fácil. Conviver com a dor também não. Aliás, na minha via sacra por consultórios, ouvi uma frase que levo para a vida: ‘Ninguém precisa viver com dor’. A medicina avançou.
Isto posto, veja como reconhecer uma enxaqueca e o que você pode fazer para ajudar sua adolescente:
- Enxaqueca não é dor de cabeça comum, causada por fome, sono ou cansaço. Ela é considerada a doença neurológica mais incapacitante que existe, atingindo 15% dos adolescentes. A dor é intensa e pode durar algumas horas ou dias.
- Na infância e no período pré-puberdade, os meninos são os mais atingidos. Na adolescência, as meninas têm mais episódios de enxaqueca. Na vida adulta, as mulheres seguem como as mais afetadas.
- Há dois tipos principais de enxaqueca: com e sem aura. A maioria das pessoas tem a enxaqueca sem aura. A enxaqueca clássica, com aura, atinge menos de 30% da população.
- A aura é um aviso que a enxaqueca está chegando. Ela pode ser visual (pontinhos luminosos, visão distorcida, pontos cegos) e também pode alterar a fala e outros sentidos. A aura começa cerca de 30 minutos antes da dor se instalar e passa antes do desconforto acabar.
- A dor da enxaqueca na adolescência é bilateral, ou seja, ela atinge os dois lados da cabeça e, geralmente, dura poucas horas. No entanto, os episódios podem acontecer muitas vezes por mês. Um dia, eles estão ótimos, no dia seguinte, a dor é incapacitante.
- Embora os especialistas não consigam determinar a causa exata das enxaquecas, existem alguns alimentos que podem disparar a dor, como álcool, cafeína, queijos, chocolate, adoçantes e diversos conservantes. Cheiros fortes, luzes intensas e barulhos também podem desencadear crises.
- Problemas emocionais também levam à enxaqueca. Depressão, ansiedade e até estresse são considerados causadores. A genética é outro fator de risco. Quando pai ou mãe é enxaquecoso, existe quase 50% de chance de o filho ser também.
- Não espere a dor se instalar de forma poderosa. Dê o analgésico no primeiro sinal de crise. Não sei se tem comprovação científica, mas manter os pés aquecidos e ficar em um quarto escuro me ajudam bastante.
- Quando as crises são muito frequentes, converse com seu médico sobre um tratamento preventivo. Desde 2014, o FDA, órgão do governo americano que regula alimentos e medicamentos, aprovou o uso do topiramato para prevenção de enxaqueca em adolescentes. Esta substância foi inicialmente usada como anticonvulsivante.
O DIÁRIO DA DOR
Aos 25 anos, com crises semanais intensas, um médico especialista em dor me aconselhou escrever em um diário o que eu tinha comido, usado e feito no dia da crise. Troquei de perfume? Anote! Treinou mais do que o normal? Anote! Também precisava registrar o dia do ciclo menstrual e episódios importantes, como estresse no trabalho, briga com marido, viagens. E, assim, durante um ano, mantive um diário detalhado. No fim, o diagnóstico foi ‘enxaqueca clássica’. Nada específico desencadeava os episódios. A enxaqueca era a doença em si e não um sintoma de alguma outra coisa. Só me livrei deste pesadelo quando eliminei o anticoncepcional oral da minha vida. Por anos, sofri. Comprometi carreira e vida social. Portanto, deixo meu alerta: nossas filhas não precisam sentir dor. A medicina evoluiu!
Fontes:
Clinical Neurology News
Cleveland Clinic
Mantenha sua filha longe do cigarro.
Atualizado em 12/06/2019.