Fui criada católica. Fui batizada. Fiz primeira comunhão. E essa foi (toda) minha história com a igreja. Mas tenho fé. Faço uma rezinha quando a angústia aumenta. Acendo uma vela e converso com um santo quando preciso falar e não tem ninguém de carne e osso para me ouvir. Chamo por meu Deus quando bate o medo, o desespero, a desesperança. Faço o sinal da cruz ao passar em frente das paróquias do bairro. Ah, batizei meus filhos. Fui até aí. Não casei na igreja, não vou à missa e, perdoe-me, Pai, não consigo achar legal carregar uma vida de culpas para, adiante, encontrar os braços do Senhor. Acredito que a vida precisa ser mais leve. Isto posto, achei que meu papel em levar a religião até meus filhos estivesse encerrado e quem quisesse ir além devesse se manifestar.
Eis que Estela, minha filha de 11 anos, pede para fazer a Primeira Comunhão. A mais velha não aceitaria nem sob tortura. É contra, não acredita, não concorda e, admito, nem sabe a razão de tanta resistência. Mas Estela é mais decidida. Eu enrolei, fingi que esqueci, deixei o tempo passar. Ela insistiu. Quer fazer a Primeira Comunhão. Não, as amigas não estão fazendo. Não, não existe influencia da escola. Não, ela não conhece ninguém na turma de catecismo da igreja perto da nossa casa. Ainda assim, ela quis e foi.
Temos um ano e meio de aulas semanais pela frente. Toda segunda-feira à noite. Ela recebe lição de casa. Precisa ler trechos da bíblia. Precisa entender o que está lendo. Precisa prestar atenção nas aulas.
Acho interessante buscar conhecimento, principalmente quando o desejo partiu dela. Acho fundamental o respeito. Se eu fiz minha escolha (de não frequentar igreja), preciso aceitar a escolha dela. Mas, acima de tudo, acho fascinante a vontade de aprender, independentemente do tema escolhido. Posso não concordar com os conceitos de céu e inferno, de culpa, de amar o próximo sempre etc e tal, mas não podemos negar que a religião (não só a católica, claro) traz um material muito rico para entender história, literatura, arte. Essa semana, por exemplo, temos o bat mitzvah de uma grande amiga. É nossa primeira cerimônia judaica. Pesquisei com as meninas o significado, os rituais e a riqueza que envolve essa celebração.
Se amanhã, ela desistir, mudar de religião ou simplesmente tiver um olhar mais crítico em relação à crença, ao menos terá argumentos sólidos que valem mais do que apenas uma pirraça contra a igreja.
Na imagem que ilustra este texto, Estela está em um tradicional templo budista, em Tóquio. A foto foi tirada em janeiro de 2017.