Para minha filha de 13 anos, celular é para ver filmes no Netflix e vídeos no YouTube. Para mim, aos 42, o celular é um meio de comunicação. E, para mim, o celular da minha filha é para se comunicar comigo. Quando ela não me atende, fico fora de mim. E estes episódios têm sido recorrentes aqui em casa. A desculpa é sempre a mesma: “não ouvi”, “não tocou”, “a bateria acabou”.
Ontem, ela tinha duas horas livres entre uma aula e outra e me pediu para estudar na praça em frente à escola ou na padaria ao lado. Disse não, obviamente. “Por que, mãe? Não confia em mim?”, perguntou. Não, minha filha, não confio no mundo. Acho que uma menina de 13 anos, sozinha, fazendo lição, no banco de uma praça, é uma criatura extremamente vulnerável. Numa cidade violenta como São Paulo, esta menina está exposta a riscos ainda maiores. Então, não, não deixo ficar na praça. Quando deixarei? Não sei. Preciso fortalecer minha confiança no mundo, na cidade, no bairro, no povo que anda na praça.
Mas a questão que parecia tão bem resolvida levantou uma dúvida (e uma angústia): eu confio na minha filha?
Então! Posso até confiar que ela não vá largar a mochila na calçada ou sairá da padaria sem pagar o chocolate. Posso confiar também que ela não vá matar aula ou andar uma quadra além do nosso combinado para comprar uma borracha na papelaria. Mais, posso confiar que eventuais mentiras serão pequenas e iguais àquelas que eu contei, que você contou, que o mundo conta desde os primórdios. E também que mentironas irão surgir ao longo da vida. Fui adolescente, gente! Não vou me enganar agora. Mas confiança vai além disso. Preciso ter confiança nas atitudes e reações dela em situações adversas. Isso eu ainda não tenho. Não vejo maturidade nela para lidar com questões corriqueiras e banais. Não vejo independência e agilidade para resolver imprevistos sozinha. E estou falando de coisas pequenas.
Outro dia, ela ficou para almoçar no restaurante a quilo perto da escola e esqueceu de levar o dinheiro. Deslize número 1. Serviu o prato, pediu o suco e terminou a refeição quando se deu conta de que não tinha como pagar. Deslize número 2. Neste ponto, poderia ter chamado o gerente, que nos conhece, e explicado. Mas não. Ela gelou. Paralisou. E me ligou desesperada pedindo ajuda (o celular funciona perfeitamente nessas horas). O desespero não foi maior porque ela estava num ambiente conhecido e rodeada de amigos. Mas a verdade é que eu esperava mais jogo de cintura nessa idade. E esperava também mais habilidade para procurar uma saída antes de se ver sem saída.
Então, não, eu não confio AINDA em uma menina de 13 anos para tomar decisões rápidas e, principalmente, ligadas à sua segurança. Até esse dia chegar, estarei por perto, na praça, na padaria e grudada no celular.